quinta-feira, 8 de maio de 2008

Tensão e Futilidade - Relato da adolescência

Acho que não faz tanto tempo assim (prefiro não afirmar nada em se tratando desta entidade estranha denominada tempo). Algo, no entanto, posso afirmar : jamais esquecerei aquele dia. A temperatura estava alta, calor típico de Porto Alegre em meandros de dezembro, abafado, sensação de ar estático, pesado, irrespirável. Aliás, não sei se a minha alma não pesava mais do que o próprio ar.
Naquele dia eu trajava preto da cabeça aos pés, o que parecia um tanto contraditório, devido ao calor do dia e à hora na qual "aquilo" se passava. Não estava sozinha, muito antes pelo contrário. Ao meu lado direito (e esquerdo também), à minha frente e às minhas costas, encontravam-se muitas pessoas. De anos de convivência escolar, reuniam-se ali todos aqueles estranhos conhecidos, a fim de celebrar o começo do fim. Era a nossa formatura do ensino médio.
A música que acompanhou a entrada da minha turma ao salão nobre do local - que, a propósito, não era tão nobre assim - tocava em minha mente, o que havia sido meticulosamente planejado. Mas quem é que planeja que a vida se repita, mesmo que seja através de incessantes notas musicais ? Bom, eu precisava tirar da mente o fantasma que não me abandonou, talvez, desde o início do meu estudo secundarista. O medo de "cair do salto", no momento em que meu nome fosse proferido, era paralisante. Eu bem que tentei convencer a turma a adentrar o salão da formatura de pés descalços, mas é incrível o quanto o ser humano pode ser hipócrita: a "gurizada", das "tribos" e estilos mais diversos, acaba por adaptar-se ao óbvio ululante da situação, para nós, garotas, era o maldito salto alto.
Aquela situação deveria ser, no mínimo, emocionante. O "normal" seria que lapsos de memória, daqueles incríveis anos de livros e doses de rebeldia, tomassem os meus pensamentos, porém foi a sandália preta com strass a eleita de toda e qualquer preocupação. É incrível o quanto o medo de ser / parecer / tornar-se ridículo tolhe atos, emoções e situações únicas.
Após muitos nomes chamados a subir ao palco, ao encontro do canudo mágico que conferia liberdade e, ao mesmo tempo, responsabilidade, chegou o meu momento. Duraram infinitos dois minutos o caminho que ia da minha cadeira até o palco, o chão era escorregadio e as curvas indescritíveis. Eu não caí o tão temido tombo. Eu resisti a essa prova final, agora sim eu estava pronta para sair dali com diploma na mão e cabeça erguida.
Em meio ao calor, às frivolidades, às emoções confusas, acabou a cerimônia de formatura do colégio Dom João Becker. Desse dia em diante, não temi mais a altura artificial que veste os pés e, para ser sincera, devo dizer que, hoje em dia, adoro saltos. As preocupações mudam, algumas futilidades dissipam, outras se agregam. Não, eu não esquecerei aquele dia, eu não vivi a emoção daquele momento em sua plenitude, MAS eu me dei conta que sou, afinal, infinitamente maior do que aquele salto.